Outrora — poema de Giovanni Pascoli
Um dia ele foi… só uma essência / sem retorno e sem outro igual.
Momentos que se fazem eternidade, felizmente todos na vida os teremos. Cabe-nos guardá-los como tesouros para consolo, não vá a vida acontecer como Giovanni Pascoli (1855-1912) refere no poema Outrora de onde transcrevi os versos de abertura, e que mais à frente refere:
E a vida foi vã aparência / antes e após um dia tal.
É-se feliz sem se estar permanente feliz. A procura interior deste equilíbrio pessoal entre ser e estar é a demanda dos nossos dias. O conselho é não deixar escapar a consciência da felicidade quando existiu:
não podes, ideia, não podes / levá-lo contigo, na mão…
Eis o poema
Outrora
Outrora, num tempo distante,
fui eu tão feliz, não agora:
mas quanta doçura no instante
por tanta doçura de outrora!
Esse ano! por anos que após
fugiram e que fugirão,
não podes, ideia, não podes
levá-lo contigo, na mão…
Um dia ele foi… só uma essência
sem retorno e sem outro igual.
E a vida foi vã aparência
antes e após um dia tal.
Um instante… aí tão passageiro,
que menos passou que se diz;
mas tão belo assim, mas tão belo,
e eu nele tão feliz, tão feliz!
Tradução de Jorge de Sena
in Poesia do Século XX, antologia, prefácio e notas de Jorge de Sena, Fora do Texto, Coimbra, 1994.
Abre o artigo a imagem de uma pintura de David Hockney de 1968.
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