“Ignorância é não saber de algo; estupidez é não admitir sua ignorância” (Daniel Turov)
um texto de Rodrigo Constantino
Um livro muito útil – além de divertido – é Manual do Perfeito Idiota Latino-americano,
escrito por Plínio Mendoza, Álvaro Vargas Llosa e Carlos Alberto
Montaner. Com estilo satírico, refuta com sólidos argumentos e dados
inúmeros mitos defendidos pela esquerda populista. Conta com um
excelente prefácio escrito por Roberto Campos, no qual afirma que “boa
parte de nosso subdesenvolvimento se explica em termos culturais; ao
contrário dos anglo-saxões, que prezam a racionalidade e a competição,
nossos componentes culturais são a cultura ibérica do privilégio, a
cultura indígena da indolência e a cultura negra da magia”. Combater os
privilégios, a indolência e a irracionalidade é justamente o objetivo
dos autores.
Essa mentalidade retrógrada realmente
desperta curiosidade. Tendo como regra básica o “jeitinho” em vez do
respeito às leis, a inveja como sentimento preponderante, e uma tola
esperança de que um Estado clarividente e eficiente seja capaz de nos
transformar em potência econômica mundial, os latino-americanos vão
permanecendo cada vez mais na miséria. Enquanto isso, os discursos
populistas e nacionalistas despertam fortes emoções em nosso povo, que
passa a acreditar que nossos recursos naturais são suficientes para nos
tornarmos ricos, e que se isso não acontece, a causa está do lado de
fora, em algum império colonialista.
Os argumentos nacionalistas são vastos, e
são também perfeitos para se encobrir interesses e privilégios de uns
poucos, argumentando que precisamos defender a soberania nacional contra
as conspirações do capital estrangeiro. Foi nessa base que se criaram
monstros como as reservas de mercado. Além disso, pensar em privatizar
empresas, entregando o patrimônio “público” para mãos privadas de
“capitalistas selvagens”, seria total loucura. Melhor mantê-las sob o
controle estatal, tão eficiente e imune à corrupção. O engraçado desse
absurdo todo é realmente alguém se achar dono do petróleo nacional, já
que “ele é nosso”.
Uma palavra idolatrada pelo nosso povo é
“social”. Em nome do social, não só tudo é possível, mas também
desejável. Esquece-se totalmente das calculadoras, e ignora-se leis tão
simples como não gastar mais do que se tem. A conseqüência natural disso
é um aumento explosivo nos gastos públicos, típico do Estado benfeitor,
que acaba inevitavelmente em um severo déficit fiscal, gerando inflação
via emissão de moedas ou recessão via aumento de impostos ou juros.
Isso sem falar de todos os direitos nobres concedidos ao povo, como
educação gratuita e obrigatória, moradia digna, transporte gratuito,
trabalho bem remunerado, velhice tranqüila e por fim felicidade eterna.
Nosso cidadão é um grande sonhador, que detesta se deparar com a dura
realidade da vida, cheia de incertezas e insegurança. Ele não se
preocupa muito com o fato de que, para garantir tanto privilégio assim a
alguns, precisa tirar de outros.
Paradoxalmente, nosso Estado em prol do
“social” deixa mais miseráveis do que encontrou, e temos inúmeros
exemplos empíricos disso, sendo um dos principais a Argentina de Peron.
Eva, sua esposa, confundiu Estado com instituição de caridade, e quem
pagou o elevado preço foi a população, que saiu da prosperidade para a
miséria. Será que o povo romântico não tem a mínima capacidade
intelectual para entender que são justamente todos esses “direitos
adquiridos” pelos monopólios dos sindicatos que jogaram metade dos
brasileiros na informalidade? Será que os mais de 150 milhões de
latino-americanos desempregados estão felizes com todos esses
benefícios? Não conseguem perceber que isso é também a causa de um
sistema de previdência falido, que até na Europa, principalmente na
França, representa uma bomba-relógio insustentável no médio prazo?
As pessoas não se conformam também com as
regras do jogo, com as leis naturais de oferta e demanda. Gostariam de
fixar os valores dos bens disponíveis na economia, acreditando que
alguns poucos burocratas seriam mais eficientes que bilhões de pessoas
interagindo. Não entendem que os preços não passam de sinais que o
mercado emite para que os processos produtivos possam contar com uma
lógica capaz de guiar racionalmente aqueles que executam a difícil
tarefa de estimar custos, fixar preços de venda, obter lucros, poupar,
investir e perpetuar o ciclo produtivo. Essas pessoas não conseguem
entender uma coisa simples que Adam Smith já havia ensinado no século
XVIII, que é a diferença entre preço e valor. Não é porque algo é
valioso, como a água, por exemplo, que seu preço será elevado. Quem
determina o preço “justo” é a lei de oferta e demanda, dependendo
intrinsecamente da escassez do produto e da preferência subjetiva dos
indivíduos. Sem falar que o lucro é desprezado por aqui, como se fosse
um pecado.
Outra característica básica da
mentalidade do atraso é a necessidade de bodes expiatórios. É
fundamental achar culpados de fora para os males internos. Logo surgiram
os “demônios”, como o FMI, a globalização, o “Consenso de Washington”
etc. Os ingênuos são tão bombardeados por esta propaganda, muitíssimo
interessante para os governantes corruptos, que nenhuma explicação
lógica ou fatos concretos seriam capazes de alterar este dogma. Será que
não percebem que para os países desenvolvidos seria melhor a existência
de um mercado consumidor para seus produtos, e não um bando de
miseráveis revoltados? Como repetir o argumento de exploração agora que o
Brasil exporta bem mais do que importa? Se acreditam mesmo que o que
torna uma nação rica são seus recursos naturais, como explicar o
crescimento explosivo de Taiwan, Coréia ou Japão na década de 80? Os
exemplos seriam intermináveis, mas é praticamente impossível convencer
alguém entorpecido pelos conceitos falaciosos do marxismo.
Alguém precisa explicar que ninguém força
nem obriga as nações a comercializarem com outras ou pegarem dinheiro
emprestado. Não acham que é mais que natural um banco que empresta
dinheiro impor algumas exigências? Pois é justamente isso que faz o FMI.
Exige em troca de dólares menores gastos fiscais, de governos
irresponsáveis que gastaram mais do que tinham, endividando de maneira
insustentável o país. Será que acham que esse empréstimo deveria vir a
fundo perdido? Será que teriam essa mesma postura no âmbito pessoal? E
quanto ao comércio mundial, chamado de globalização, será que acreditam
que existe um plano mirabolante das multinacionais para dominar os povos
latino-americanos? A GM, quando emprega mais de 100 mil pessoas nas
Américas, pagando milhões em impostos, estaria tentando dominar nosso
povo? Se negociar com esses “imperialistas sanguessugas” é tão ruim
assim, como explicar a revolta cubana ao embargo americano? Esse embargo
não passa da proibição das empresas americanas de fazer negócios com
Cuba, já que este país permitiu se tornar uma base militar da União
Soviética, apontando mísseis para a Flórida. É no mínimo contraditória a
posição do críticos da globalização.
Como alguém pode afirmar seriamente que a
exploração das colônias por vorazes metrópoles explica o
subdesenvolvimento de umas às expensas de outras? Será que a Espanha e
Portugal estão melhores hoje, sem colônias, ou antes, com elas? A
riqueza da pequena Holanda é explicada pelas ilhas que dominava no
Caribe ou na Ásia? Mais riqueza tem a pequena Suíça sem jamais ter
conquistado um palmo de território alheio. O que não dá é alguém achar
que, em pleno século XXI, está em condições favoráveis de enriquecer e
competir com uma banana em uma mão e uma saca de café na outra. Depois
não adianta ficar reclamando dos baixos preços de nossos produtos no
mundo, enquanto os “imperialistas” nos “empurram” produtos caros, como
computadores e outros bens de alta tecnologia. Em vez de ficar culpando a
globalização, os neozelandeses, por exemplo, possuem um nível de
desenvolvimento econômico europeu, graças à criação de milhões de
ovelhas, exportações de flores e frutas e uma boa oferta de turismo
ecológico. Outros povos que preferiram ser pró-ativos a ficar
esbravejando de forma imatura e irracional foram Taiwan, Coréia,
Cingapura, Hong Kong etc. Alguém pode atribuir o sucesso dessas nações
aos recursos naturais delas? Como alguém pode, diante de tantas
evidências, ainda ficar culpando a globalização pelos seus fracassos?
Como o francês Jean-François Revel muito
bem colocou, “o objetivo do terceiro-mundismo é acusar e, se possível,
destruir as sociedades desenvolvidas, não desenvolver as atrasadas”.
Como alguém pode progredir com uma mentalidade dessas? De que adianta a
postura reativa de se fazer de vítima o tempo todo, a não ser enriquecer
a classe dos políticos corruptos e empresários ligados a estes governos
clientelistas e corporativistas? Como fazer para que os ludibriados por
uma idealização da inveja consigam acordar deste sonho para poder focar
nas verdadeiras raízes dos problemas, que residem na própria cultura do
povo, e não em fatores exógenos?
O capitalismo liberal é o que não aceita a
existência de oligarquias cobiçadas pelo poder, grupos de privilegiados
apenas por serem “amigos do rei”, empresários que “mamam nas tetas” de
um Estado cada vez mais inchado. Capitalismo livre não combina com
excesso de intervenção estatal, que distorce as leis naturais de oferta e
demanda, criando resultados ineficientes. Como pode então alguém ter a
coragem de atrelar os problemas da América Latina ao capitalismo
“selvagem” importado dos americanos? Onde está esse capitalismo liberal
na América Latina? Por quê não olham a renda per capita acima de US$ 10
mil da Coréia do Sul, comparada a menos de US$ 500 da irmã socialista do
Norte? Qual seria a explicação, já que a população tem a mesma origem,
assim como recursos naturais? Basta comparar a renda per capita de
países como Estados Unidos, Cingapura, Holanda e Inglaterra com a de
países como China, Coréia do Norte, Cuba e Vietnã para entender de vez
qual modelo defende mais o interesse dos pobres. Basta comparar também
dentro de alguns países os períodos de socialismo e pós-socialismo, como
o Chile antes e depois de Allende, para deixar claro qual modelo
realmente defende os pobres.
O arsenal de besteiras fruto dessa
mentalidade do atraso parece infindável. Suas vítimas não conseguem
enxergar coisas óbvias, como o fato de onde existe mais Estado, criando
barreiras alfandegárias, licenças prévias de importação, controle de
preços e câmbio, subsídios e burocracia, existe também mais miséria e
desigualdade social. O crescimento abusivo do Estado cria uma total
asfixia nos empresários, fundamentais para a criação de riqueza e
empregos. Esse Estado interventor é o pai de uma burocracia parasitária e
de empresas públicas paquidérmicas e profundamente ineficientes. Mas
diante de tais evidências, qual a solução apresentada? Mais Estado, mais
regulamentações, mais controles e mais dirigismo, que são justamente as
causas fundamentais dos problemas. Querem curar a leucemia com
sanguessugas!
Em uma coisa pelo menos é preciso dar
crédito aos defensores do atraso: seu linguajar. São mestres na arte de
vender sonhos e utopias através da pura retórica. Seus “argumentos” são
românticos e emocionados, acalentando os frágeis corações das pessoas
que precisam desesperadamente de alguma explicação fácil e algum culpado
direto pelas desgraças e misérias que assolam suas vidas. Alimentam a
fúria irracional que o desprezível sentimento de inveja cria. Saciam o
desejo de vingança dos povos atrasados, dando uma saída muito mais fácil
do que a de reconhecer os próprios erros e mudar. Acontece que não é de
sonhos e utopias que o mundo precisa. Não é através de desculpas
fervorosas nem de discursos românticos que a miséria acaba. Não é a
retórica emocionada que coloca pão na mesa das pessoas. O mundo precisa,
para reduzir a miséria, da única coisa que a esquerda nunca foi capaz
de gerar: resultado!
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